quinta-feira, 30 de abril de 2009

PARANOIA URBANA (parte 6ª/6)

(continuação da postagem anterior)
Fixando, irada, os olhos dele, Mariana sentiu que ele baixava os braços, fazendo alguns movimentos desajeitados, e alguma coisa caiu dentro da sua bolsa. Então abandonou rapidamente o veículo, que havia parado em um ponto qualquer.
Ao sair, verificou que o homem não a havia seguido. A chuva, por um momento, a fez esquecer o seu pavor. Estava ainda longe de sua casa mais de seis quarteirões. Abriu a sombrinha branca e, descrente de conseguir um taxi, iniciou uma aflita caminhada para o seu apartamento. Escolhia ruas onde não havia paradas da linha do ônibus que usava. Com essa estratégia, imaginava evitar um reencontro com o abominável homem que a assaltara. Mas — ela se alegrou — conseguira recuperar o seu relógio, a jóia que mais estimava, entre as poucas que possuía, porque ela o comprara em substituição ao do seu marido, que fora roubado. Apressou o passo, receosa das ruas escuras e solitárias, repletas de árvores fantasmagóricas sacudidas pela ventania.
Ao entrar em casa, chorando, ouviu o som da campainha do telefone que ficava em cima da mesinha de cabeceira, no seu quarto. Quando chegou lá, o telefone parou de chamar. Porém ela não deu maior atenção ao aparelho, porque avistou, ao lado do mesmo, o seu relógio. Esquecera-se de colocá-lo no braço ao sair de casa para trabalhar, deduziu apavorada. “Então, o que é que está dentro da minha bolsa?” — perguntou-se, confusa.
Correndo para a sala onde tinha deixado a bolsa, ao entrar, abriu-a, vertendo todo o seu conteúdo sobre a mesa de centro. Entre um batom, um pente, um canivete com a lâmina exposta, uma carteira e um molho de chaves, jazia um elegante relógio masculino.
Abalada pela certeza da terrível delinquência do seu ato, ela deixou-se cair no sofá. As lágrimas, então, rolaram livres, em cascatas. “Assaltei aquele homem! E agora, o que é que eu faço?” — pensou, recriminando-se interiormente pela sua insensatez, prometendo a si mesma jamais agir daquele modo impulsivo.
Desconsolada, virou o objeto entre os dedos. No fundo prateado, leu a seguinte dedicatória, que ela mesma, há tanto tempo, mandara gravar:
“Ao meu querido Heleno, com o amor eterno da sua Ioneide Stella.”
F I M

Nenhum comentário: