quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Conjugação obrigatória

Futuro, presente e tempo passado
Os verbos nos ensinaram a conjugar,
Esvaecendo a simples realidade
Nos cacos de um espelho trincado,
Deitando fumos de dúvidas no ar,
Rotulando verde a azul cor da verdade.

O misterioso futuro, remoto porvir,
Incapaz de um só reflexo embaçado
Com referência, com zênite ou nadir
No aço desse espelho fragmentado,
Noção abstrata, não podia existir!

As pitonisas já não recebem o preito,
Os presságios já não têm uma guarida...
Como perceber da próxima etapa o jeito
Se a predição não vinga na escura ermida,
No túnel negro desse absurdo conceito?

Espremido entre o passado e o futuro
Esforça-se o presente em refletir...
Entre paredes, seria também um muro
Cuja espessura não se poderia medir.
Etéreo ser, confirmá-lo não é seguro...

O presente é um tão fugaz instante
Que mensurá-lo a ninguém apraz.
É impossível saber o que vem adiante
Mas é possível ver o que está atrás
E apreender este universo importante.

No pretérito todos nos encontramos,
Tudo ali o soberano tempo deteve;
Nós não seremos, nós sempre fomos
Pálidas imagens que a memória reteve,
Um punhado de lembranças é o que somos!

No lugar das palavras de uso surrado
Afirmar-se-ia: Pensei, logo existi!
É preciso que se entenda o recado...
Desde que César disse: “Vim, vi e venci”,
Somente poderíamos conjugar o passado!

Se o costume a realidade mascara
E falta à regência verbal fidelidade
Presume-se: alguma coisa não ficou clara.
Pode a mentira armada inferir realidade
Que se proclama aos ventos e se declara,
Travestindo-se em sofismática verdade?

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