Querido mano,
Cumpro, com prazer, o dever de lhe informar que fui o ganhador do acumulado da Mega-Sorte. O prêmio saiu aqui para Belo Horizonte, onde estou morando atualmente. Foi perfeito!
Portanto, inesquecível mano, estou milionário. Felicidade! Felicidade! Felicidade! Perfeito! Perfeito! Perfeito! Posso até distribuir a felicidade e realizar o seu sonho, posso concretizar os sonhos de todos os meus caríssimos cinco irmãos.
Para tanto, solicito de você uma declaração, assinada por duas testemunhas, dizendo qual é o seu sonho... Pode ser uma casa, um carro, até um caminhão... Qualquer coisa que o dinheiro possa comprar terei a maior alegria de adquirir para o mano, desde que o pedido seja razoável, perfeito? Eu, que sou um arquiteto perfeito, quero ser o perfeito engenheiro da felicidade do mano. Desculpe a minha exigência de testemunhas, mas acho que ela é perfeitamente necessária...
Cumpro, com prazer, o dever de lhe informar que fui o ganhador do acumulado da Mega-Sorte. O prêmio saiu aqui para Belo Horizonte, onde estou morando atualmente. Foi perfeito!
Portanto, inesquecível mano, estou milionário. Felicidade! Felicidade! Felicidade! Perfeito! Perfeito! Perfeito! Posso até distribuir a felicidade e realizar o seu sonho, posso concretizar os sonhos de todos os meus caríssimos cinco irmãos.
Para tanto, solicito de você uma declaração, assinada por duas testemunhas, dizendo qual é o seu sonho... Pode ser uma casa, um carro, até um caminhão... Qualquer coisa que o dinheiro possa comprar terei a maior alegria de adquirir para o mano, desde que o pedido seja razoável, perfeito? Eu, que sou um arquiteto perfeito, quero ser o perfeito engenheiro da felicidade do mano. Desculpe a minha exigência de testemunhas, mas acho que ela é perfeitamente necessária...
* * *
Antônio Carlos retirou da caixa do correio, de manhã, em sua casa de Poços de Caldas, uma cópia da carta-circular contendo a introdução acima. O extenso resto do texto, ele não se deu ao trabalho de ler. Julgou que não teria a menor importância, como tudo que provinha do seu irmão mais novo, que se esquecera de assinar. Antônio Carlos identificou-o pelo nome que constava no verso do envelope como sendo o do remetente e pelo uso abusivo da palavra “perfeito”, cuja repetição confirmava que era mesmo o chato do seu irmão caçula.
“Além de metido a engraçadinho, o irresponsável ainda cometeu a grosseria de enviar a carta sem assinatura. Será que ele teve a cara-de-pau de imaginar que eu vou acreditar nessa armação?”, pensou Antônio Carlos. Passados tantos anos, sua antipatia continuava igual. Iniciara-se nos tempos de infância, nas brigas com o irmão, que sempre levava vantagem apesar de ser mais novo; o caçula era invencível no sarcasmo, e ferino nas respostas, que pareciam decoradas. Depois, teve que aturar-lhe as brincadeiras sem graça. Finalmente, foi obrigado a pagar as vinte e quatro prestações de um empréstimo que avalizara — contrariando a profética oposição da sua mulher Jerusa —, o que acabou por azedar a sua relação.
Passou um lenço na careca, para tirar o brilho do suor. Ia responder à carta do irmão, sim! Ria ao imaginar os termos da resposta. Mas não ia contar nada para a Jerusa. A gozação do belo-horizontino bastava, não precisava dos gracejos da sua esposa, que não se cansava de rir, irônica, humilhando-o mortalmente toda vez que se lembrava do empréstimo. “E da besteira”, ela completava, “que fiz quando entrei para a sua família”. A mulher poderia achar que o sem-vergonha tinha ganhado mesmo na loteria e querer que ele, Antônio Carlos, se rebaixasse pedindo qualquer coisa para compensar o prejuízo com o maldito empréstimo.
— E a ridícula exigência de declaração, com duas testemunhas? Quem ele pensa que é? — resmungou Antônio Carlos para os bichos paranóicos que habitavam em sua cabeça.
Antônio Carlos retirou da caixa do correio, de manhã, em sua casa de Poços de Caldas, uma cópia da carta-circular contendo a introdução acima. O extenso resto do texto, ele não se deu ao trabalho de ler. Julgou que não teria a menor importância, como tudo que provinha do seu irmão mais novo, que se esquecera de assinar. Antônio Carlos identificou-o pelo nome que constava no verso do envelope como sendo o do remetente e pelo uso abusivo da palavra “perfeito”, cuja repetição confirmava que era mesmo o chato do seu irmão caçula.
“Além de metido a engraçadinho, o irresponsável ainda cometeu a grosseria de enviar a carta sem assinatura. Será que ele teve a cara-de-pau de imaginar que eu vou acreditar nessa armação?”, pensou Antônio Carlos. Passados tantos anos, sua antipatia continuava igual. Iniciara-se nos tempos de infância, nas brigas com o irmão, que sempre levava vantagem apesar de ser mais novo; o caçula era invencível no sarcasmo, e ferino nas respostas, que pareciam decoradas. Depois, teve que aturar-lhe as brincadeiras sem graça. Finalmente, foi obrigado a pagar as vinte e quatro prestações de um empréstimo que avalizara — contrariando a profética oposição da sua mulher Jerusa —, o que acabou por azedar a sua relação.
Passou um lenço na careca, para tirar o brilho do suor. Ia responder à carta do irmão, sim! Ria ao imaginar os termos da resposta. Mas não ia contar nada para a Jerusa. A gozação do belo-horizontino bastava, não precisava dos gracejos da sua esposa, que não se cansava de rir, irônica, humilhando-o mortalmente toda vez que se lembrava do empréstimo. “E da besteira”, ela completava, “que fiz quando entrei para a sua família”. A mulher poderia achar que o sem-vergonha tinha ganhado mesmo na loteria e querer que ele, Antônio Carlos, se rebaixasse pedindo qualquer coisa para compensar o prejuízo com o maldito empréstimo.
— E a ridícula exigência de declaração, com duas testemunhas? Quem ele pensa que é? — resmungou Antônio Carlos para os bichos paranóicos que habitavam em sua cabeça.
(continua) * * *
Um comentário:
Olá, estou aguardando a continuação.
Abraço.
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